A UE cumprirá as promessas de reduzir emissões de dióxido de carbono?Há apenas 18 meses, a União Europeia comprometeu-se a salvar o mundo combatendo as alterações climáticas.
Está para breve o anúncio de um plano para cumprir aqueles promessas. Mas existirão grandes dificuldades no seu cumprimento.
As conclusões da Cimeira de Março de 2007, proclamando a União Europeia como "motor" da resolução do problema climático, são apenas votos piedosos. Elas começavam com "a Europa beneficia actualmente de uma recuperação económica", e acrescentavam que as previsões de crescimento são "positivas".
Nesses tempos benignos, que desapareceram há muito, os líderes europeus estavam com humor heróico. Fizeram promessas firmes com o slogan "
20/20/20".
Isto é, no ano de 2020, as emissões de carbono da União Europeia seriam reduzidas em, pelo menos,
20 % em comparação às de 1990,
20 % do consumo total de energia proviria de fontes renováveis e a eficiência energética reduziria
20 % do consumo que se verificaria sem essa poupança.
O humor heróico está agora ultrapassado. Em Março de 2007, Angela Merkel, chanceler alemã e presidente da Cimeira de então, era uma campeã vestida de verde. Hoje ela parece-se como uma
lobista das empresas alemãs, defendendo uma lista de indústrias que devem ser protegidas do custo [ruinoso] de um tal plano. Na verdade, quase todos os países têm agora razões para achar que as promessas sobre a luta contra as alterações climáticas seriam impossíveis de cumprir.
A Grã-Bretanha está pessimista sobre as suas metas para as energias renováveis. A Irlanda afirma que os seus agricultores devem ser protegidos (as vacas irlandesas alimentam-se com erva e emitem metano).
Vasculhando mais profundamente na impossibilidade da resolução dos problemas, cai-se na questão do dinheiro disponível. Na UE, os litígios financeiros são resolvidos, normalmente, não sem dor. Mas um outro problema difícil de resolver surge.
Os países que usam o carvão, como a Polónia, temem que o pacote Durão Barroso sobre alterações climáticas os vai obrigar ao abandono do carvão. A alternativa aparentemente imediata e fácil seria o gás natural. Mas o pavor da Polónia é que este gás é russo. A Rússia, apesar de tudo, fornece estes seus vizinhos nervosos, há pelo menos 18 meses, com a hipótese de cortes no fornecimento; após a situação de guerra na Geórgia a Polónia ficou ainda mais assustada.
A Polónia produz mais de 90% da sua electricidade a partir do carvão. A gigantesca central termoeléctrica de Siekierka, em Varsóvia, fornece electricidade e aquecimento a dois terços da capital polaca em cada Inverno. Um monte de carvão ao lado da sua central contém 180 mil toneladas, suficientes para 18 dias de produção no Inverno. É um lugar estranhamente confortável, se ignorarmos o pacote climático de Durão Barroso.
Quase todo o carvão é polaco e vem diariamente através de comboios a partir da Silésia. Nas tardes deste Outono, o único cheiro que se respira na central vem de folhas mortas e de carvão fresco. O único ruído vem de um bulldozer que movimenta montes de carvão. As três chaminés operam sem fumo, é impossível ver a libertação do invisível dióxido de carbono para a atmosfera.
O cerne do pacote de combate às alterações climáticas da UE é o Esquema de Direitos de Emissão (ETS, acrónimo do inglês
emissions-trading scheme). Este esquema obriga ao pagamento das emissões de dióxido de carbono das fábricas e das centrais termoeléctricas como a de Siekierka.
Quanto mais elevado for o preço da tonelada de carbono emitido mais caro sai às fábricas e às centrais. Tal facto suscita a ideia de trocar o carvão por outro combustível. O governo polaco está em pânico com os recentes relatórios técnico-económicos, concluindo que o preço da tonelada de carbono emitido é muito mais elevado do que era apontado nas estimativas da Comissão Europeia.
Em Fevereiro de 2008, um documento da UBS – União de Bancos Suíços, deu o sinal de alarme ao prever que 43% das centrais termoeléctricas a carvão da UE tinham de substituir o combustível para cumprir as metas do pacote Durão Barroso relativo à emissão de dióxido de carbono.
No longo prazo, a Polónia coloca a hipótese das tecnologias do carvão “limpo”, incluindo a captação e armazenamento do dióxido de carbono. Mas isso vai levar anos a concretizar (fontes oficiais polacas pensam no recurso à energia nuclear, mas esta opção também levará anos a concretizar).
O que preocupa os polacos é o médio prazo. Por isso, os polacos pretendem manter a energia baseada na economia do seu carvão. "O carvão é a nossa segurança energética", afirma Mikolaj Dowgielewicz, ministro polaco para as questões europeias.
Em 26 de Setembro, os ministros da Bulgária, Hungria, Polónia, Roménia e Eslováquia assinaram uma declaração conjunta na qual expressaram a sua preocupação pelo facto de o combate às alterações climáticas "aumentar significativamente" a dependência de alguns países relativamente ao gás importado.
Com o pacote Durão Barroso, na sua forma actual, não há hipótese de um acordo entre os 27 países da UE, diz Dowgielewicz. A ironia é que a segurança energética foi um elemento-chave para convencer os europeus de Leste a aderir ao plano das alterações climáticas de Março de 2007.
Os seus dirigentes receberam a garantia de que a transição para as energias renováveis os ajudaria a evitar uma excessiva dependência das importações de energia.
As conclusões de Março de 2007 prometiam mais "solidariedade" europeia em caso de crise de abastecimento energético (por exemplo, a Rússia fechar as suas válvulas).
Houve promessas de diversificação dos fornecimentos, bem como o apoio a projectos como o gasoduto Nabucco que iria trazer o gás do mar Cáspio até à Europa Central, contornando a Rússia.
Lidar com o urso russoMas estas promessas, na sua maioria, são ocas. Os membros da UE continuam a assinar com a Rússia acordos que minam o projecto Nabucco. A Alemanha continua a defender o gasoduto Nord Stream, um projecto conjunto com a empresa russa Gazprom.
A guerra na Geórgia mostrou como a União Europeia mantém a unidade frente à Rússia: fazer concessões. E os dirigentes russos movimentam-se em torno da periferia da UE, defendendo traçados russos e procurando investir em novos pipelines que vão transportar o gás para a Europa (incluindo um da Nigéria), mas que eles controlam ou influenciam.
No início deste ano, a Rússia declarou que iria construir um complexo nuclear em Kaliningrado, um enclave entre a Polónia e a Lituânia. Demasiado grande para as necessidades de Kaliningrado, este complexo tem potencial para exportar energia, segundo os responsáveis do nuclear russo.
Isso representa um dilema para os países vizinhos. A sua entrada em serviço, pouco depois de 2015, irá produzir electricidade com zero de emissões de carbono, mas a importação desta energia pela UE tornará os europeus cada vez mais dependentes da energia russa.
A Polónia quer modificações no pacote Durão Barroso que permitam a continuação da queima do seu carvão sem se arruinarem com o ETS. Mas ninguém pode culpar o ETS de marginalizar os produtores de carvão. Este esquema foi concebido, apesar de tudo, para tornar economicamente pouco atraentes os combustíveis com alto teor de carbono.
A UE dispõe de uma solução mais importante. É possível realizar algumas das suas promessas, de Março de 2007, sobre segurança energética.
Isso significa menos acordos bilaterais com a Rússia, mais projectos de terminais de importação de gás natural liquefeito, o apoio a projectos diversificados de gasodutos que contornem a Rússia, o reforço da interligação das redes de eléctricas e aumento da liberalização da energia.
Os europeus de leste não aceitarão um plano de combate às alterações climáticas que não lhes ofereça uma maior segurança energética.
E quem pode criticá-los?
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Fonte:
The Economist.