segunda-feira, abril 03, 2006

Dinâmica do Árctico (3)

Qualquer análise baseada em temperaturas médias do conjunto do Árctico e das regiões periféricas não é esclarecedora quanto à evolução térmica da região. Somente o estudo dinâmico do ar que parte e do que chega é capaz de a clarificar.

Existem estudos que sintetizados permitem identificar a dinâmica dos anticiclones (ar frio que parte) e dos ciclones (ar quente que chega) acima da latitude 65 ºN. Entre 1952 e 1989 registou-se a actividade que se expõe seguidamente.

· No Inverno, os ciclones foram mais frequentes na parte oriental do Árctico e no leste do Canadá. Estenderam-se até ao Mar de Kara. O número máximo situou-se na vizinhança da Gronelândia e no Mar da Noruega onde as depressões foram mais cavadas.

Os ciclones ocorreram também na Baía de Baffin embora com pressões menos cavadas. Foram nitidamente menos frequentes no centro do Oceano Árctico, na Sibéria e no Alasca.

Nesta estação do ano, os anticiclones mais frequentes e potentes situaram-se no Árctico ocidental, na Sibéria oriental, no nordeste do Alasca e na Gronelândia.

Serreze et al. afirmaram que «associated with the Siberian, central Arctic Ocean and Alaska/Yukon frequency maxima tend to be strongest» - Vd. “Characteristic of Arctic Synoptic Activity, 1952-1989, Meteorol. Atmos. Phys., 51, 147-164, 1993” (Refª. Marcel Leroux).

No Inverno, a situação na Ásia foi dominada pela existência de enormes aglutinações anticiclónicas (AA) de vários anticiclones móveis polares que iam a caminho da China, como aconteceu neste ano de 2006.

As temperaturas baixas dos solos favoreceram a manutenção das AA. Reconheceu-se a existência do designado anticiclone “Siberiano” ou “Sibero-Mongoliano”, semelhante ao dos “Açores”.

As enormes dimensões e elevadas pressões das AA dificultaram o encaminhamento normal dos fluxos ciclónicos para a região polar. Recorda-se que foi uma forte e extensa AA na Europa ocidental que, impedindo o ar tropical de seguir a caminho do Pólo Norte, provocou a vaga de calor do Verão de 2003.

A diferença que se notou entre Inverno e Verão residiu no número de anticiclones e ciclones. No Inverno os anticiclones, embora ligeiramente menos numerosos, foram seguramente mais potentes e mais próximos no espaço.

O fluxo de ar frio que foi expelido por intermédio dos mais vastos AMP criou depressões mais profundas com condições de formação de tempestades ciclónicas muito intensas no Inverno.

· No Verão, a dinâmica geral foi parecida com a do Inverno mas com diferenças na potência e na distribuição dos anticiclones e dos ciclones. Os AMP foram mais fracos e os ciclones foram menos cavados do que na estação anterior.

Nesta estação desapareceu o anticiclone “Siberiano”. A actividade ciclónica foi agora mais extensa e os ciclones distribuíram-se mais amplamente ao longo do Árctico (Serreze et al.).

Existiram diferenças no padrão da distribuição das áreas de alta pressão. Os anticiclones produziram-se com maior afastamento espacial entre si. O maior número deles observou-se na Gronelândia, Sibéria e o Alasca.

No Verão, o maior número de anticiclones observou-se no Mar de Beaufort e no Arquipélago Canadiano. As pressões mais elevadas encontraram-se a norte do Alasca e do Canadá.

Os AMP, essencialmente formados por ar frio, originaram-se preferencialmente no ocidente do Árctico (a norte do Canadá e a oriente da Sibéria). Os fluxos ciclónicos de retorno, de ar quente, atingiram preferencialmente o oriente do Árctico.

O Mar da Noruega e o Mar de Barents foram «common entrance zones for systems migrating into the Arctic» (Serreze et al.). Esta assimetria, entre as saídas e as entradas preferenciais, da dinâmica e do clima do Árctico é fundamental.

Tanto para o Árctico Atlântico como para o Árctico Pacífico a assimetria permite compreender a situação dos mantos de gelo e do mar gelado daquela região nas suas configurações sazonais.

Se estes aspectos essenciais não são levados em consideração tiram-se ilações erróneas quando se calculam temperaturas e pressões que não são seguramente representativas da situação real do Árctico.

Um outro aspecto importante do estudo de Serreze et al. foi a análise da evolução do número de anticiclones e ciclones sazonais ao longo dos anos. Desde logo se concluiu que no Outono, entre 1952 e 1989, o número aumentou pouco.

Já o mesmo não aconteceu no Inverno, na Primavera e no Verão em que se verificaram aumentos significativos do número, tanto dos anticiclones como dos ciclones. Faltou confrontar esses aumentos, em número, com os aumentos da potência e da depressão.

Mas o estudo não estava virado para esta importante questão. Em conclusão, os autores do estudo prestaram um avanço considerável na percepção da dinâmica do tempo e do clima do Árctico que não se pode confundir com especulações avulsas.

(continua)